Pessoas estão demais a se preocupar com esta menina. Notoriamente percebe-se o porquê. Observe-a, ela escolheu ficar assim a qualquer canto da casa jogada como um trapo, usando às vezes uma certa camisa que a envolve de lembranças.
Essa menina que não se faz muito tempo e nem muito pouco estourou as ideias com uma pistola de rancor que a transformara em uma outra ela. Ela mudou, se conheceu de uma outra maneira. Se rebeldiou pode se dizer assim, se apresentou aos novos e alguns velhos com uma nova roupagem. Era ela, sendo ela, uma outra ela, prendendo a velha ela dentro dela mesma, não de mentira, mas vivendo uma verdade criada por ela.
A verdade mais mentirosa. Queria se enganar, queria se iludir, não queria aceitar, queria viver de uma nova maneira, não queria ser mais ela, não queria ser mais dele. E não foi atrás e se afastou. Tudo era uma defesa, ela só queria se proteger de se mesma, não queria ombros, não queria vivenciar magoas, dividir tristezas ou correr atrás delas. Não queria demostrar que sofria e mentia para não mostrar sua dor, seu orgulho ferido, para não ter que explicar a ninguém e para ele não ver que ela ainda o amava. Que por ele sofria e por isso mentia, se dizia muito bem, muito livre, muito feliz.
Saio ao mundo, mundo novo, mundo estranho, mundo demasiado de gente que ela não conhecia mesmo que conhecendo. Foi andando e descobrindo tudo muito que rapidamente. Ela não se assustava, não tinha medo, perdeu quase que todos os sentidos e sentimentos, esfriou-se, não pestanejava, não ligava pra mais nada, não engolia ao seco, mas aos montes e vivenciou coisas e se misturou a elas. No perigo, na corda bamba.
Fazia-se alegre, mulher sem dores e feridas, sem cortes ou cicatrizes. Era perfeita nas conclusões, decidida ao que queria. Se desfez de fotos, de lembranças. Encaixotou tudo, repassou presentes, não queria nada dele. Pois ele não se encaixava mais a nova ela. Só festejava, aprontava às vezes, enganava aos montes e não amava, não chorava, não sentia, era pura anestesia, uma viva morta. Linda, bem vestida, maquiada, no salto, olhar que mentia, que enganava. Na pista dançava, no bar bebia e aos tolos castigava com sua canalhice. Todos a adoravam assim. Uma fingida. Mas ninguém sabia o que se passava, ela escondia, não compartilhava. Não confiava em ninguém.
A maior das pilantras na verdade escondia em baixou das roupas a ferida que teimava em não cicatrizar. Com mentiras tentou suturar o corte que haviam deixado, drenar também não funcionou. O grande corte que ele a fez no peito sangra tão lentamente que a faz se nausear das ideias.
Depois de tantas loucuras, escolheu ficar quieta, em seu canto. Viu que nada que fez adiantou. Que não a fazia bem. Ela não o esqueceu. Ela ainda o ama e senti sua falta. Notou-se que ficar ali embaixo de suas cobertas ou no seu quintal a banhar-se de sol ou da lua, é muito mais seguro do que se deixar tocar pelo mundo que não é seu, que não é sua escolha, que não a faz bem por dentro e que estraga sua pele. Por vezes se agarra ao travesseiro, o inunda com sua alma, tenta resgatar as magoas, as raivas, mas é inútil ela não o deixa e de amar e se pega no fim de cada lembrança ruim sussurrando um te perdoou repetidamente em dezenas, em centenas, ela o perdoa incansavelmente fortalecendo o que senti.
Preferiu ficar assim do que a continuar a se enganar. Ela não se viu com necessidade de se auto mutilar e deixa-se sujar por mesquinharias e escrotisses aleias. Resolveu se mostrar como é a se mesma. Se aceitou. Aceitou seus reais sentimentos, aceitou a dor. Não tem mais vergonha de se mesma por amar quem ama. Por amar que a ferio tanto. E por isso agora ela se isola. Ela não quer contato, ela quer ficar só, não quer ninguém, prefere a dor ou o amor que ela não mais tem. Seu amor distante, que a esqueceu. E por isso sofre, sofre com saudade, com nostalgias, com lembranças, com devaneios e desejos que não controla.
As pessoas que estão a se preocupar com esta pessoa a ligam, a visitam, a convidam aos montes. Mas ela não quer ir a lugar algum, ela não quer ouvir nada, nem dizer nada, ela não quer nada do que a oferecem. Ela só quer viver ao seu modo, quieta, do seu jeito. Afogada nos livros, em seus estudos.
A dizem que ela precisar encontrar um novo amor. Sair e se diverti, ocupar o tempo. Que se trancafiar dessa maneira não resolve, que precisa rir e encontrar quem a faça rir. Que precisa tocar algo, tocar alguém. Que precisar deixa-se levar a vida. Mas ela não quer, ela não deseja a ela nada disso. Ela não que sair e encontrar um novo amor. Pra ela isso é ridículo, maior falta do que fazer, ideia de gente vazia que não sabe o que é amar. Amor pra ela não se acha assim em qualquer esquina. Pode ser no acaso, pode ser a um primeiro olhar, mas não dessa maneira, onde se empluma e vai à rua, procurando um rosto qualquer e escolhe “é aquele bonitinho que vai ser meu amor e decidido”. Não, para ela amor não se procura, não se acha, amor pra ela aparece mais que de repente. Ela estando em casa ou não, momento certo ele aparece. Tocar, ela não quer tocar ninguém, não acha certo ao seu corpo, ao seu peito ferido, as suas vontades. Ela não estar ao desespero da carne, não estar com vontades, ela vive sem beijo, sem sexo, sem roer osso. Ela vive bem sem isso. Ela não é ninfomaníaca, conclui-se assim. E tem muitas coisas a fazer, não vive com seu tempo parado. Tem seus sonhos e precisa dedicar-se a eles para transforma-los em realidade.
A menina por mais que não pareça, vive bem, vive feliz por muitas vezes. Se gosta assim quieta, na sua nova rotina. Tem tudo e não tem do que reclamar. Pernas pra cima, comer, dormir, estudar. Vivendo de livros, escrever, musica, dança, series, filmes. Vida boa ela conclui. Ela só senti falta do sentimento, do carinho, dele e de mais ninguém. Se quer ajuda-la com algo, não atrapalhe, não ofereça ombro, mas sorvete de tapioca e brigadeiro ela aceita. Boas conversas e brindes de gargalhadas ela também aceita. Só não forcem a ela ser ou fazer o que ela não quer. Deixe-a viver a dor e quem sabe assim um dia para ela tudo isso passa.
Williane Santos
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